Todos os anos se fala do mesmo: a possibilidade de o Estádio Nacional ser substituído por um, recinto mais moderno para acolher a Taça de Portugal. O argumento tem vindo a ganhar tração nos últimos anos alimentado principalmente por quem, tem de traçar planos de segurança e vê naquele local escapatórias a mais que obrigam a maior elasticidade de acção e multiplicação de recursos. A preocupação é legítima face ao modelo atual de organização de jogos de salto risco e do comportamento de massas, mas é ainda mais nobre e simbólico a decisão de manter, de ano para ano, intocável o estatuto do Jamor como a casa do desporto português (do futebol também).

 Transferir a final para qualquer outro estádio não seria apenas uma machadada na história e no imaginário coletivo de várias gerações, mas um sinal muito mais preocupante – de que os maus venceram. Porque é isto que está sempre em causa: minorias com comportamentos radicais que obrigam a gastos gigantescos de reforço policial e sem que a maioria se pronuncie, limitando-se a um encolher de ombros perante o desfile de claques nas famosas caixas de segurança um espetáculo degradante mas necessário enquanto não se encontram novas soluções.

Mas talvez seja este o momento para os grandes coletivos se chegarem à frente na condenação todos os comportamentos que ultrapassem a margens de decência e urbanidade independentemente de usarem ou não as suas cores. Benfica e Sporting voltarão a defrontar-se na final da Taça de Portugal, 29 anos depois do enfame episódio do verg Light, e mais do que nunca exige-se um sentido de responsabilidade individual que deve estender-se também a cada um dos espectadores.

 Excessos há em todo o lado e o futebol não pode e não deve ser um local assético, mas uma sociedade desenvolvida é aquela onde estão traçadas linhas vermelhas comportamentais aceites por toda a população, seja num festival de música, numa manifestação ou numa ida à bola. Infelizmente ainda são necessários passos nesse sentido cá por estas bandas, embora sinais recentes dão-nos esperança: há uns anos seguia-se um silêncio no Estádio da Luz cada vez que alguém imitava sons do very Light num dérbi de futebol ou de modalidade; hoje já são audíveis os assobios de muitos milhares que conseguem ter um pensamento crítico. Daqueles que fazem da final da Taça de Portugal uma festa como poucas na Europa, apenas possível no Jamor.

Orlando Fernandes